O caso da auxiliar administrativa Jenifer Alves de Almeida, 33 anos, que não conseguiu a admissão de sua filha com autismo no Sesc Escola Horto, em Campo Grande, está longe de ser único. Dificuldade na hora de matricular filhos diagnosticados com Transtorno do Espectro Autista (TEA) em escolas se repetem em Mato Grosso do Sul e no País.
Uma outra mãe denunciou a O Jacaré que a escola onde a filha estuda, na Capital, retirou a bolsa de estudos de 41,7% da estudante ao efetuar a matrícula no sexto ano do Ensino Fundamental. Segundo ela, a justificativa da unidade de ensino para retirar o benefício foi devido aos custos para auxiliar a aluna com professor de apoio.
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Indignada com a situação, Islene travou um embate com a escola Elite Mace, que ofereceu dar 10% de bolsa, mas, ao final, manteve o índice zerado. Após ameaça de processo, foi concedido o desconto de 32%.
“Eu fiz a rematrícula com 0% de bolsa. Agora, quando foi ontem [3 de janeiro], eu entrei no portal e eles lançaram 32% de bolsa, porque eu já ameacei, avisei que eu vou entrar na Justiça e tudo mais. Então eles voltaram e mantiveram 32%. Mas agora não é mais a questão de quantos por cento de bolsa, e sim de eles estarem diminuindo a bolsa da minha filha porque ela tem um professor de apoio”, relata Islene.
Segundo a mãe da menina, em conversa com outros pais de alunos bolsistas, ela verificou que nenhum outro estudante havia perdido o benefício. “Ninguém perdeu a bolsa, todos continuam com bolsa”, diz.
Islene acredita que a retirada da bolsa de estudo de sua filha Isabelle, 11 anos, foi uma medida para fazê-la desistir da matrícula e tirar a menina da escola, pois a mensalidade subiria de cerca de R$ 700 para algo em torno de R$ 1.600. No entanto, a mãe vai manter a criança na Elite Mace, por estar adaptada ao método de ensino e não querer efetuar a troca.
“A intenção, então, era que eu tirasse, disfarçadamente. ‘Vamos tirar a bolsa, que ela tira a menina da escola porque não vai ter como pagar’. E no momento em que eu ameacei que ia processar, que eu ia denunciar na Secretaria de Educação, na imprensa, daí eles viram que eu fiz a rematrícula, então eles foram lá e jogaram um pouco de um valor de bolsa novamente”, relata Islene.
A reportagem entrou em contato com a escola Elite Mace, que ficou de repassar ao setor de atendimento à imprensa, mas depois não deram mais respostas.
Atualmente, Islene diz estar em contato com um advogado e espera o final do recesso judiciário para “analisar se os documentos que eu tenho são suficientes” e ajuizar uma ação.
Dificuldade no País
Jenifer e Islene não estão sozinhas nas dificuldades encontradas por pais para matricular crianças e adolescentes com autismo em escolas. No mesmo dia em que O Jacaré revelou o caso de Helena Alves, o Jornal Nacional, da TV Globo, mostrou casos semelhantes em outras partes do País.
A nutricionista Roberta Vargas começou a procurar uma escola para o filho autista em junho. Ela entrou em contato com cinco escolas particulares de Porto Alegre. O menino tem uma assistente terapêutica paga pela família, que o acompanha em sala de aula. Em todas, a resposta foi que não tinha vaga.
“Eles falam que eles podem ter dois ou três autistas por turma, PCDs no caso geral. Então, se tiver um down, eles também contam. Foram meses, escolas que bloqueavam a gente no celular para não dar retorno. Algumas deram retorno por escrito, mas a grande maioria te liga e fala que não tem mais a vaga e é isso”, conta Roberta.
Na sexta tentativa, uma escola aceitou a matrícula.
“Várias situações de mães e pais que quando revelam para a escola que o filho é uma criança com deficiência, sobretudo autista, a vaga some”, diz Aline Kerber, presidente da Associação de Pais e Mães pela Democracia.
A Constituição Federal, em seu artigo 205, determina que a educação é direito de todos e dever do Estado e da família, sendo promovida e incentivada com a colaboração da sociedade. A Resolução do CNE/CEB nº 2/2001, que define as diretrizes nacionais para a educação especial na educação básica, estabelece que as escolas do ensino regular devem matricular todos os alunos em suas classes comuns, com os apoios necessários.
Além disso, conforme o artigo 8º da Lei nº 7.853, de 24 de outubro de 1989, é considerado como crime punível com reclusão de 2 a 5 anos e multa, “recusar, cobrar valores adicionais, suspender, procrastinar, cancelar ou fazer cessar inscrição de aluno em estabelecimento de ensino de qualquer curso ou grau, público ou privado, em razão de sua deficiência”.
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