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Em meio a incêndios, 1,4 milhão de hectares de florestas de eucalipto viram desafio de conservação em MS

Por Liana Feitosa

Além do Pantanal, outras enormes áreas de vegetação de Mato Grosso do Sul correm perigo. O Estado tem o desafio de prevenir que o fogo, que já destruiu 1,6 milhão de hectares do seu território, atinja também florestas plantadas de eucaliptos, pinos e seringueiras.

Na primeira semana de agosto, um incêndio queimou 20 hectares de uma plantação de eucaliptos em fazenda localizada às margens da BR-262, bem próxima da região urbana de Campo Grande, na saída para Três Lagoas.

No Estado, existem 1,4 milhão de hectares dessas árvores que, diferente das árvores nativas, são cultivadas para fins comerciais.

Só no caso do eucalipto, dos 79 municípios do Estado, 72 cultivam esse tipo de árvore. Áreas da costa leste de Mato Grosso do Sul têm a maioria dessas florestas, principalmente as cidades de Ribas do Rio Pardo, Três Lagoas e Água Clara.

Importância das florestas plantadas

É dessas plantações que o Estado produz celulose, o produto florestal mais exportado por Mato Grosso do Sul no primeiro semestre de 2024.

Ou seja, a celulose obteve o maior faturamento entre todos os produtos vendidos pelo agronegócio sul-mato-grossense nesse período, representando US$ 1,059 bilhão em exportações.

Além disso, existem diversos benefícios ambientais. Essas árvores promovem melhor aproveitamento de solos ocupados pela pecuária e, o acúmulo de carbono na madeira, é um fator muito importante na compensação de gases de efeito estufa.

É o que explica o consultor técnico do Senar/MS (Serviço Nacional de Aprendizagem Rural de Mato Grosso do Sul), Clovis Tolentino.

Relevância ambiental

Matéria orgânica em floresta plantada de eucalipto (Foto: Divulgação Bracell).

Segundo o consultor, esse carbono contribui de forma relevante no objetivo que Mato Grosso do Sul tem de se tornar um estado carbono neutro, ou seja, que neutraliza suas emissões de CO₂, o dióxido de carbono.

“O cultivo de florestas plantadas ainda permite a redução do risco de erosão do solo, pois como são cultivos de longa duração, não há revolvimento da terra, como ocorre em um solo sem cobertura”, amplia o consultor.

“A presença de raízes e folhas aumentam o teor de matéria orgânica na superfície, o que facilita a infiltração de água”, explica.

Além disso, os galhos e as folhas das copas das árvores também reduzem os impactos das gotas de chuva, reduzindo a velocidade com que a chuva atinge o solo, o que também facilita a infiltração da água no solo. Além de contribuir com a umidade do solo, as sobras geradas pelas árvores também proporcionam benefícios. 

“Estudos indicam que a presença de árvores pode reduzir algo em torno de 10ºC na temperatura do ar embaixo delas. Isso também impacta a temperatura do solo”, pontua Tolentino.

Isso porque um solo com menor insolação permite o desenvolvimento de micro-organismos que ajudam a fazer a decomposição da matéria orgânica, fornecendo nutrientes para o solo.

Todos esses fatos contribuem para o equilíbrio do meio ambiente e, portanto, exigem cuidados em torno de sua preservação, desafio crescente no Estado diante das mudanças climáticas globais.

Jacaré morto em incêndio no Pantanal (Foto: Henrique Arakaki, Midiamax).

Artigo científico publicado recentemente no site World Weather Attribution revela que as mudanças climáticas tornaram os incêndios 40% mais intensos no Pantanal.

Segundo o artigo, a ocorrência de eventos extremos, como estiagens prolongadas e incêndios florestais, que sempre fizeram parte da vida no Pantanal, serão cada vez mais frequentes e severos.

Queimadas em solo sul-mato-grossense

Entre 1º de janeiro e 20 de agosto deste ano, 1.668.075 hectares do território de Mato Grosso do Sul queimaram, segundo dados do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Especiais).

Em 2024, o tamanho de área queimada no Estado é 7,5 vezes maior que o registrado no ano passado, quando 219.950 hectares de Mato Grosso do Sul pegaram fogo nesse mesmo período.

Os dados constam no Informativo nº 13 do Cemtec (Centro de Monitoramento do Tempo e do Clima de MS), divulgados nesta sexta-feira (23), e se referem a porções dos biomas Pantanal, Cerrado e Mata Atlântica localizados no Estado.

Big Brother das florestas

Para evitar que o mesmo tipo de devastação atinja florestas plantadas, um contingente impressionante de ações conjuntas, ferramentas e recursos são empregados.

Um deles é o monitoramento das plantações de eucalipto, como explica Junior Ramires, presidente da Reflore MS (Associação Sul-Mato-Grossense de Produtores e Consumidores de Florestas Plantadas). A entidade reúne as mais importantes empresas da cadeia produtiva da floresta do Estado.

Conforme Ramires, 90% das áreas plantadas de MS são atualmente monitoradas por câmeras.

“Dentro do grupo de trabalho de prevenção a queimadas há uma cooperação. Quase 90% das áreas são monitoradas por câmeras para prevenir incêndios, principalmente das grandes indústrias, e esse trabalho é coordenado entre as empresas”, explica.

De acordo com ele, há acordo de compartilhamento de equipamentos, recursos e informações, de maneira constante, para evitar desastres e perdas.

Entre os equipamentos utilizados em cooperação estão até mesmo aviões. “Contratamos aviões em conjunto para ficar à disposição nesses momentos mais críticos, e também há toda uma comunicação. Sabendo que uma empresa está precisando, outra se desloca para ajudar porque há monitoramento e divisão da informação na tentativa de, principalmente, evitar o incêndio”, detalha o presidente da entidade.

Diferentes combates

Ramires explica que, ao menor foco, é preciso agir com rapidez porque, diante das condições climáticas atuais, muito rapidamente um foco de calor se transforma em incêndio florestal.

“No caso do Pantanal, existem áreas de muito difícil acesso, focos localizados em áreas muito inacessíveis de propriedades, por exemplo. No nosso caso já é mais fácil, nossas áreas são cortadas, com várias vias de acesso, então isso ajuda”, reconhece.

Corpo de Bombeiros Militar combatendo incêndios em MS (Foto: Edemir Rodrigues).

Essas corporações também contam com o apoio do Corpo de Bombeiros em áreas localizadas próximas às cidades. “Ocorre que nossa maior produção está longe das cidades”, aponta Ramires.

Por isso, é realizado treinamento ostensivo antes do período de seca, com ajuda do Corpo de Bombeiros para a formação de brigadas e treinamento de pessoas que poderão coordenar ações dos brigadistas.

Apesar de não serem uma exigência legal, a presença de brigadas de incêndio nas propriedades rurais é uma prática recomendada por entidades como a Reflore e a Famasul (Federação de Agricultura e Pecuária de MS).

“As brigadas voluntárias podem atuar nas comunidades onde estão, ajudando a conscientizar as pessoas quanto aos riscos de se utilizar o fogo, bem como podem fazer o primeiro combate em situações onde o incêndio está em fase inicial”, explica Tolentino.

Consciência

“No entanto, o melhor é a prevenção, é não deixar o fogo acontecer”, adverte. “Mas a prevenção exige um trabalho coletivo”, completa.

Empresas, entidades, Corpo de Bombeiros, governos. Mesmo se todos esses esforços estiverem focados nos combates às chamas, mas não houver conscientização individual de cada cidadão, essa “guerra” já está perdida.

Para ele, a prevenção precisa ocorrer em todos os ambientes, na cidade e no campo. Em propriedades rurais, o fogo destrói patrimônios, maquinários, ferramentas, mas também destrói patrimônios naturais.

Por isso, o pedido é pela prevenção. “Se prepare, faça os aceiros, tenha seus equipamentos de combate para uma eventual emergência, nem que seja uma bomba d’água”, detalha Ramires.

Tragédia florestal

Em junho de 2017, um enorme incêndio florestal causou a morte de 64 pessoas e deixou mais de 200 feridas na região central de Portugal.

O calor intenso, o tempo seco e o vento forte contribuíram para que as chamas se alastrassem com muita rapidez e a catástrofe ganhasse proporções inéditas. Muitas pessoas morreram carbonizadas dentro de seus carros em uma estrada cercada pela floresta.

Mais de 1.600 homens, 495 veículos, e 15 aeronaves foram mobilizados para conter o fogo. As equipes, no entanto, tiveram dificuldades de se aproximar da região porque as labaredas eram intensas. Foram necessários 5 dias para acabar com o incêndio.

Prevenção salva

Na cidade, o risco permanece. O representante lembra que o fogo promove prejuízos econômicos, mas também coloca em risco a saúde e a vida das pessoas.

“O cidadão precisa saber que não pode deixar isso acontecer. O fogo nesse momento de seca é uma atitude, principalmente na cidade, de enorme risco à saúde, ao patrimônio e à vida”, reforça Ramires.

“Não faça fogo na estrada, não jogue lixo na via, tudo isso gera risco de incêndio. Não ponha fogo neste momento, infelizmente o fogo não respeita limite. Se colocar aqui, pode acabar em São Paulo ou no Pantanal, todo mundo deve se preocupar”, finaliza.

midiamax.com.br

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